"Do mesmo modo e em relação a uma vida sem lustro, o tempo carrega cononosco. Mas um momento chega em que temos de ser nós a carregá-lo. Vivemos sobre o futuro: "amanhã", "mais tarde", "quando tivermos uma boa situação", "com a idade hás-de compreender". Estas inconsequências são admiráveis, porque enfim, trata-se de morrer. Um dia vem, no entanto, e o homem constata ou diz que tem trinta anos. Afirma assim a sua juventude. Mas ao mesmo tempo situa-se em relação ao tempo. Toma aí o seu lugar. Reconhece que está num certo momento de uma curva, que confessa ter de percorrer. Pertence ao tempo e reconhece nesse horror que o empolga o seu pior inimigo. Amanhã, ele desejava amanhã quando todo o seu ser se lhe devia recusar. Esta revolta da carne é o absurdo."
Camus, A. (1974). O Mito de Sísifo. Lisboa, Livros do Brasil, p. 25.
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